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Jorge Mautner: o lúdico, a poesia, a irreverência e a infância

 

Jorge Mautner, músico, pensador e profeta do Kaos, um dos inspiradores do Tropicalismo, parceiro de Gil e Caetano. Quem já não ouviu falar desse artista, ligado em Nietzsche, capaz de passar do samba da velha guarda à visão existenciante, ao rock e à tragicidade alegre e dionisíaca? Autor de letras e músicas geniais, como Maracatu Atômico, Lágrimas Negras, entre tantas outras. Porém, um lado pouco percebido desse poeta é aquele que traz imagens e memórias da infância, assim como uma visão lúdica da vida e das coisas.

Você já se tocou nisso: filosofia, poesia e irreverência com cara de gibi?   

Em Mautner, há coisas para se mostrar às crianças e outras que nos faz pensar sobre a criança que fomos. E que continuamos, sendo, apesar dos pesares. Aliás, eu penso que essas letras e músicas deveriam ser estudadas no ensino de Português – e porque não, de filosofia também – para as crianças do ensino fundamental. Quem quer saber um pouco mais sobre o Mautner pode também ver este post que publiquei no meu blog Olho de Corvo: Jorge Mautner – poética e política do ser.

Coisas para crianças

Algumas músicas e letras de Mautner poderiam ser divulgadas para a recepção infantil. Elas não foram feitas para a infância, e por isso mesmo tornam-se muito interessantes. Eu sempre cante para os meus filhos, como bom desafinado que sou, algumas dessas músicas que me parecem de um achado visionário incrível do Mautner. A primeira, é o Samba dos Animais, e traça um painel irreverente da nossa história sobre esse planeta:

“O homem antigamente falava
Com quem? com quem? com quem?
Com a cobra, o jabuti e o leão
Olha o macaco na selva
Aonde? aonde? ali no coqueiro!
Mas não é macaco baby, é meu irmão!
Porém durou pouquíssimo tempo
Essa incrível curtição
Pois o homem, rei do planeta
Logo fez sua careta
E começou a sua civilização
Agora já é tarde
Ninguém nunca volta jamais
O jeito é tomar um foguete
é comer desse banquete
Para obter a paz – aquela paz
Que a gente tinha quando falava com os animais
Quém, quém, quém
Miau, miau
Au, au, au, au
Bom dia dona Cabrita, como é que vai?”

Aqui, uma versão de O Samba dos Animais cantada por Lulu Santos:

A outra é Herói das Estrelas, que traz toda uma mitologia de iniciação e aventura. Quem leu muito gibi na infância  e tem um espírito alegre vai curtir muito isso:

O herói tem uma capa de estrelas
E um cinto de cometas
E na testa a estrela solitária
Da irmandade dos planetas
Voa o seu voo noturno
E nos dedos ele usa os misteriosos
Fulgurantes sete anéis de saturno
E tem nas mãos uma espada de luz
Que um anjo astronauta lhe deu

Quando se encontraram pelo espaço
E ao anjo astronauta ele então respondeu:
– O meu caminho eu sei
Mas eu não sei qual é o seu
No universo tudo voa
Tudo parece balão
É que pra mim, anjo astronauta
Só me interessam os caminhos
Que levam ao coração”.

Gilberto Gilo cantou uma versão de Herói das Estrelas:

 

 

E ainda nessa trilha, lembraria do famoso Sapo Cururu, que Mautner foi buscar no nosso folclore:

Este sapo cururu não anda de bicicleta
Mas ele anda dizendo que a lua é careca
Ah, se a lua fosse careca
Ela usava cabeleira

Ah, como é bonita a bandeira brasileira!
Ah, como é bonita a bandeira brasileira!

E no vídeo a seguir, a música cantada por Jorge Mautner no grande e genial disco, Para Iluminar a Cidade – produzido no clima underground e de contracultura. Mautner já trazia a mistura de visões e culturas que viriam com o Tropicalismo:

 

Coisas de criança

Há músicas no repertório de Mautner que rementem ao universo infantil diretamente. Uma delas retrata um menino solitário, inventor e apaixonado. Trata-se de Um milhão de pequenos raios. E vou recitá-la aqui de memória, pois não encontrei em lugar algum a letra completa:

“O menino chuta lentamente a sua bola?/ Tendo através de si a velha escola/ E ele gama naquela menina/ Cujo pai trabalha num posto de gasolina/ Esse menino é um inventor/ E fabrica papagaios/ Fez um que se parece/ Com um céu azul e um milhão de pequenos raios.”

Fica a dica.

Referências

Site de Jorge Mautner

Jorge Mautner – poética e política do ser

 

Por Luiz Carlos Garrocho

Pesquisador e criador cênico, arte-educador e militante estético-cultural.

2 respostas em “Jorge Mautner: o lúdico, a poesia, a irreverência e a infância”

Salve, Garrocho!

Que coisa mais linda!!!

Por coincidência, acabo de ler o livro “A epopeia do pensamento ocidental”, de Richard Tarnas.

Ambos, a leitura do Tarnas e a escuta ativa do “Samba dos animais” do poeta Mautner, na voz “surfante” de Lula Santos (um luxo!), fazem a gente ter esperança na vida, a despeito de toda essa sensação de incompletude e finitude propiciada por esta experiência chamada modernidade, da qual aparentemente ninguém parece conseguir escapar… e de esperança e fé na vida é o que mais estou precisando, nesses tempos de incertezas emocionais, proféticas e climáticas… muito obrigada!

Um abraço terno, Carolina.

Ei, Carolina,

Que bom você ter curtido o Samba dos Animais. E parabéns pelo belo site, o Tímpano, de educação musical.
Abraços

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