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A criança, o circo e a educação

Imagem: Kamshots

Não sei por que as escolas insistem tanto que as crianças façam apresentações de teatro para a comunidade de pais, com recitações, imitações de show-business e do padrão interpretativo das novelas de televisão. Talvez, a explicação esteja aí mesmo: a escola como reprodução social. No entanto, existem tantas expressões presentes na cultura popular, mais interessantes, mais vivas. Pois se trata, afinal, de como articulamos ritual e imagem.  

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O fim da infância (1)

Venho sempre defendendo a idéia de que a educação infantil deve se pautar pela cultura do brincar. Porém, como se não bastassem as dificuldades conceituais e práticas encontradas em muitas escolas, com uma carga cada vez maior de conteúdos formais, significando o encolhimento da infância, de seus espaços e tempos, deparamo-nos, agora, com o fato de as crianças de seis anos serem incluídas, sem qualquer preparo de profissionais e das escolas, no ensino fundamental. Pelo menos, é o que a realidade tem mostrado.

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Lembranças de um recreacionista II

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Imagem de Gonzáles-Alba

 

Num outro texto abordei a Função do brincar na educação infantil. Volto às lembranças do recreacionista que fui. Desta vez, no entanto, quero cuidar de outra questão: a diretividade ou não-diretividade da ação. Como se colocar diante do universo lúdico da criança? Isso depende, naturalmente, do contexto. No caso, estamos abordando a função do educador no recreio escolar.

Como recreacionista, vivi experiências que me trazem, ainda hoje, insights muito interessantes. Antes de tudo, é preciso voltar ao lugar das lembranças. Como dizia no outro texto, tudo começou mesmo na Escola Balão Vermelho. Estávamos no início da década de 1970, colhendo os efeitos do recrudescimento da ditadura militar, das perseguições políticas, num clima de medo. E no meio disso tudo, três educadoras, Bete Lobato, Ieda Brito e Maria Helena Latalisa,  resolveram abrir um espaço para o porvir: uma escola para a educação da sensibilidade, para a busca livre do conhecimento e do estabelecimento de novas relações entre as pessoas. E como disse antes, começavam por mudar o conceito de recreio: não mais o oposto ao trabalho, mas o que lhe é complementar  e o resignifica em última instância – o brincar como o trabalho da criança, exploratório e sensível, rizomático e aberto.

Nos primeiros momentos, eu adentrava naquele mundo das brincadeiras infantis. As crianças tinham um quintal, com areia, terra, árvores etc. Não havia o medo de se sujar, como observo em algumas escolas hoje. Aliás, outro dia vi um tanquinho de areia numa escola que ficava a altura das mãos das crianças, para que elas não precisassem entrar nele – e nem podiam, pois era apenas uma espécie de canteiro. Ou seja, envolver-se com o mundo sim, mas apenas com a ponta dos dedos…

Era uma agitação molecular. Quando digo isso, quero dizer com base em Gilles Deleuze que as crianças vivenciam encontros não previsíveis nos espaços do recreio. Acho que na maioria das escolas, hoje, os espaços são excessivamente delimitados – isto é, delimitadores. Molares, para pensar de novo com Deleuze. As crianças já encontram brinquedos e formas de brincar moldadas, formatadas: um tanque de areia, brinquedos etc. Não que eles não possam existir, mas não precisam dominar a paisagem. No caso do Balão Vermelho, nós tínhamos à nossa disposição um quintal: aquilo que o nosso blog amigo, o Quintarola, tanto valoriza.

Qual a função do recreio na educação infantil? Naquela demanda do Balão Vermelho nos idos 70 estava uma ideia muito importante: espaço potencial de educação, de atividades de conhecimento, porém num modo não diretivo. Mais do que isso: com os materiais que a criança encontra a mão para manipular e se envolver de modo não programado. Misto de meio natural (terra, árvore, areia, espaços, pedrinhas, folhas, gravetos…) e produzido (espaços, brinquedos de arquitetura etc.).  E então entramos na questão: eu começava entrando num campo de agitação molecular, onde as coisas todas (toda sorte de brincadeiras e de encontros não planejados) já estavam acontecendo.

Que não se entenda a não-diretividade como espontaneísmo etc. E aqui reside a maior causa dos enganos pedagógicos: deixar como estar para ver como é que fica. Os educadores, nessa hora, estão tomando café, conversando, distraindo-se etc. Nós, recreacionistas, sabemos que essa é a hora.

Difícil ver e entender o que acontece nesse campo de agitação molecular. No outro texto chamo a atenção para os processos metaestáveis, sistemas auto-organizados, emergentes etc.  Os educadores deveriam ser educados a aprenderem a ler o ambiente flutuante e móvel do brincar não dirigido. E descobrir ali, também, suas repetições, suas linhas molares, segmentadas, pois que elas existem ali.

Mas eu não tive a oportunidade de olhar de fora o brincar das crianças. Fui logo caindo naquele mundo. Caíram meus modelos, minhas máscaras, minhas defesas. E entrei em contato com a vida pulsante do brincar nos quintais.

O que eu fazia? Eu me envolvia diretamente com as atividades das crianças. E eu me descobria brincando com elas. Não havia método, eu estava descobrindo as coisas… Maria Helena Latalisa, a Leninha, logo me deu um “presente” que me acompanharia por toda a vida em todas as minhas outras atividades: um diário de campo.

Aqui, também, o primeiro passo para adentrar num processo não diretivo e que evita, contudo, de cair no buraco do espontaneísmo. O registro das atividades, das perguntas, das questões… No emaranhado das experiências você puxa uma linha, acompanha seu desenvolvimento, sua direção… E então pode voltar, no dia seguinte, com outro modo de entrar naquele mundo.

Podemos perseguir, assim, outro modo de nos entendermos como recreacionistas: nem não diretivos e nem diretivos – em processo. Guardiões do processo, deveria ser o nome da profissão de quem trabalha com a recreação  na educação infantil. Muito diferente do recreacionista que tem por função apenas oferecer objetos (bolas, cordas para pular, jogos etc.) para as crianças. Ou que vive somente de “controlar” o momento do brincar.

O momento em que as crianças estão livres de atividades dirigidas, voltadas para o brincar somente, é uma cartografia de espaços e tempos. Uma configuração experimental, como aborda Gerda Verden-Zöller.

Voltando às anotações, através delas  você descobre um meio de realizar uma intervenção não intervencionista, se me explico bem.  Quero dizer que você toma posse de uma imanência e, a partir dela, interage com o meio, seus impulsos e o outro. Quanto aos cadernos, eles tornam-se uma criação sua, servindo a múltiplos fins. Os cadernos de campo foram meus grandes aliados. E continuam sendo. Em toda e qualquer aula ou oficina de teatro, ou mesmo ensaio, meus diários estão ali, rabiscando a pele das coisas, fazendo mapa.

Depois, passada a primeira fase – a do espanto na ação – comecei a trabalhar de modo cada vez mais diretivo. Passei do recreacionismo para a oficina de arte, no caso, de teatro. Mas, a cada vez que aprofundo mais nesse caminho diretivo, redescubro o primeiro dia, aquele em que cheguei num quintal e brinquei com crianças sem qualquer direção predeterminada. Apenas seguindo a intuição e as linhas de errância do brincar.

Uma volta mais diretiva exige, a toda hora, uma revolta menos dirigida.

Referências –

Imagem de Gonzales-Alba: Muro com manchas, rachaduras e grafia

 

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O brincar e a educação infantil II


As férias vão se encerrando e começam as preocupações de todos os pais: onde matricular crianças na faixa de até seis anos de idade.Volto-me sobre as questões apresentadas numa postagem primeira sobre as relações entre o brincar e a educação infantil: o significado dos tempos e dos espaços para o brincar, o currículo escolar, a nossa visão sobre o desenvolvimento das crianças etc.

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Cidade do Recife: cultura da criança e educação infantil

Estive na cidade do Recife, nos dias 09 e 10 de setembro, para participar de um encontro de Formação Continuada de Auxiliares de Desenvolvimento Infantil, promovida pela Secretaria Municipal de Educação.

Foram 02 dias de conferências sobre o tema “Traçando o mapa do brincar: trajetos, ritmos e rotas imaginárias“, acompanhadas de uma oficina. É a terceria vez que vou à cidade do Recife e arredores (Camaragibe e Cidade do Cabo de Santo Agostinho), convidado a contribuir nos projetos e programas de educação infantil.

Marina Machado: a criança, o brincar e o teatro

Marina Marcondes Machado vem pesquisando há anos a cultura lúdica da infância e suas conexões com as artes, especialmente com o teatro. Tive a felicidade de conhecer pessoalmente Marina e tê-la como companhia numa oficina com educadores no Encontro Mundial de Artes Cênicas, em Araxá/MG. E descobrir afinidades: a infância como o plano sobre o qual educação e arte deveriam se voltar. Infância-memória e infância-presença: os meninos e meninas que fomos e as crianças todas com quem nos deparamos no dia-a-dia.

Marina publicou três livros muito preciosos: O Brinquedo-Sucata, Poética do Brincar e Cacos de Infância. O primeiro apropria-se especialmente das teorias de Winnicott, que é o psicanalista que escreveu o genial O Brincar e a Realidade. O livro é um clássico. E Marina faz uma bela introdução ao pensamento de Winnicott, expondo esse espaço que está entre o objetivo e o subjetivo, que é o da experiência lúdica. Já Poética do Brincar parte com Bachelard e abandona-se nesses vôos. Em Cacos da Infância ela discute as relações da infância com a criação teatral, especificamente com a questão do personagem criança.

Uma autora para ler e reaprender sobre a infância e o brincar.

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O brincar e a educação infantil – I

Kandinsky big

A postagem é uma versão resumida de uma conferência realizada em Outubro de 2005, para a rede de educação infantil da Prefeitura da Cidade do Cabo de Santo Agostinho, Pernambuco.

Imagem: Kandinsky

Por que o brincar?

O desafio colocado é pensar a função do brincar na educação infantil quando os conteúdos escolares, a preocupação com a aquisição de conhecimentos com bases científicas ou mesmo definida pela importância central do domínio da linguagem escrita, pressionam no sentido contrário.

A educação estaria na linha direta de formação para um conhecimento que constitui o repertório e a capacidade de renovação da técnica humana, capaz de transformar a matéria e produzir riqueza. Entretanto, muitas são as técnicas. E uma técnica é um modo de entrar no mundo, de habitá-lo. O brincar, nesse sentido, constitui uma tekné (do grego): ao seu modo, ao seu jeito, cabendo a nós compreendê-lo operativamente como um modo de buscar um saber sensível exploratório. Mais ainda: a tekné do brincar é uma invenção das crianças de todo o mundo. Mesmo que tenham que lidar sempre com um mundo construído e regulado pela cultura dos machos adultos, as crianças do mundo reivindicam para si, seja às escondidas, seja às expensas dos programas e compromissos já delineados, a tekné que é uma entrada singular no mundo. Singular porque é uma coisa de criança. E qual é essa tekné (essa coisa de criança)? Ela é um modo de dar sentido à vida antes que os sentidos prontos se imponham sobre ela.

Espaços do brincar

Paul Klee: Rising Sun

Quando visito uma escola de educação infantil, a minha atenção dirige-se imediatamente para os espaços reservados para o brincar.

Muitas vezes, os espaços estão já pré-figurados, de modo que as crianças apenas devem se encaixar neles. A amarelinha desenhada em tamanho pradão, os carrinhos ou brinquedo industrializados, e por aí vai…

Não é saudosismo, mas necessidade de sobrevivência de nossas crianças e, por isso mesmo do povo do futuro: que hajam quintais!

Terrenos baldios e quintais (e, num outro tempo, as ruas) foram os espaços livres de descoberta e imaginação para muitas crianças. O capitalismo ainda não as havia descoberto como sujeitos para o consumo. Assim, largados ao léu, podíamos correr, brincar, inventar e habitar mundos.

As escolas de educação infantil, muitas delas, cederam ao capitalismo na sua descoberta do filão infância. E assim povoam os espaços de objetos já configurados para a brincadeira.

Há uma sala vazia, com um baú ao fundo, cheio de objetos variados? É importante que seja vazia, que se possa correr, cair, rolar etc. Mas, na economia escolar, uma sala vazia parece desperdício. Ora, o brincar é puro desperdício – é luxo dos sentidos. E não vale a pena para o capitalismo, assim como para a sujeição das forças da vida à princípios transcendentes (objetivos traçados pelo comprometimento adulto com esquemas de aprendizagem fechados etc.), abrir espaço e tempo para os sentidos. Em primeiro lugar, porque implica em deixar de consumir e, em segundo, porque algo fugirá do controle!

Há espaços externos que permitem interações diversas? Há vãos livres?

Os brinquedos de subir e trepar, as cordas, os balanços, são definições prévias, mas configuram desafios físicos. O que eu questiono é o mundo pronto e pré-fabricado que se dá às nossas crianças. O mundo já vem pronto. Ao contrário disso, o brincar é a re-invenção do mundo. A sua adoção, para pensar com Bernard Stielgler, em suas singularidades. O consumo, ao contrário, ou a cultura que Stilegler chama de hiperindustrial, quer transformar as singularidades em padrões existenciais. Curiosamente, as crianças apropriam-se de objetos e arquiteturas produzidas como padrão e as pervertem completamente. Transformam seus usos. Porém, alguns projetos pedagógicos não entendem essa dinãmica e passam a já pré-figurar o desejo de transformação, próprio da infância.

Voltando a adentrar nos espaços de uma escola, eu me pergunto: há árvores? Árvores são o que há para a imaginação infantil. Encontra-se um pouco de terra?

E, afinal, a grande pergunta: os educadores que “tomam conta” dos espaços dedicados ao recreio foram educados para extrair conhecimento do ato de brincar? Estão preparados para entender cultura da criança como um modo de habitar o mundo, uma via de pensamento sensível, com seus traços expressivos e suas configurações energéticas?

Referência:

STIELGLER, Bernard. Reflexõies (não) contemporâneas. Organização e tradução de Maria Beatriz de Medeiros. Chapecó: Argos, 2007.

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A função do recreio na educação infantil: lembranças de um recreacionista I

Qual a função do recreio na educação infantil?

Pensar sobre esse tópico envolve também discutir as oposições clássicas que o processo de modernizaçã das sociedades produziu: trabalho X lazer. E a escola não cessa de reproduzir essa divisão. Um binarismo que foi produzido pelo mundo do trabalho, diga-se de passagem.

O primeiro registro em minha carteira de trabalho me definia assim: recreacionista (1). Era uma escola infantil, o Balão Vermelho, e eu deveria me dedicar ao momento em que as crianças brincam livremente no pátio. De um modo diferente dos professores, que ensinam uma matéria, o recreacionista é um profissional que cuida do recreio. Mas o que significa isso, o recreio, num projeto de educação infantil?

O que as educadoras (2) que estavam à frente do projeto pensavam era, justamente, superar a divisão clássica entre trabalho e lazer. O brincar era visto como uma forma de trabalho da criança e, como tal, deveria ser encarado. A proposta não era a de ensinar alguma coisa a alguém. Haveria que ocupar os espaços do recreio e, potanto, fazer dele não a oposição ao trabalho, mas um outro tipo qualificado de trabalho.

Estava começando a fazer teatro. Não havia nenhuma teoria. Nenhum conhecimento prévio. Bastava que acompanhasse as crianças, que estivesse ali com elas, de modo não dirigido.

Um quintal com areia, terra, um pé de goiaba e um pé de jabuticaba. Uma grande mesa. Meninos e meninas de 04 a 06 anos.

As crianças se envolviam com terra, areia, objetos diversos, contato corporal. A minha função, como recreacionista, não era a de criar uma ordem, na modalidade de jogos estruturados, em termos de uma atividade dirigida. O desafio era o contrário disso: envolver-me com as atividades livres das crianças, sem conduzí-las, descobrindo seu dinamismo próprio. E o filósofo Gilles Deleuze (3) fala de um plano de dinamismos, de velocidades e espacializações, de circulação do desejo, que é sempre um plano virtual, que não se opõe ao real, mas sim ao atual.

E como isso pode ser feito em tornar-se criança? E pode um educador torna-se criança?

Numa primeira instãncia, eu entrava em contato com a minha infância. Numa segunda instância, eu era introduzido, pelo desafio e coragem das educadoras e pelo convívio com o brincar, num processo novo de pensar e agir: a atividade que não se volta para um fim extrínseco a ela mas consitui, em si mesma, o seu próprio fim. Fui, posteriormente estudar isso em Kant e Fichte. Uma diferença que o brincar proporciona: astúcia da vida frente à violência do ato de tornar-se adulto.

Um educador, quando encontra-se com a cultura lúdica da infância, entra em contato com o que o filósofo Gilles Deleuze chama de bloco de infância: um fluxo de sensações que não se enquadram em nenhuma visão linear e cronológica do tempo (4).

Descubro, hoje, que naquelei ntenso movimento, de aparente desordem, havia ordem. Não falo de uma ordem estável, mas sim das ressonâncias do brincar exploratório e sensível como os sistemas auto-organizados – tema ao qual tenho devotado uma atenção maior. Enfim, um caos de criação contínua, que os adultos têm dificultade de entender. Não porque não possuem acesso a um possível mundo mágico. Muito mais porque não foram treinados a ver.

O que os educadores têm aprendido sobre o brincar? Como o têm exercitado? Alguém me dirá que a escola não foi feita para o brincar, mas para a aprendizagem. E nisso recomeçam os problemas: uma aprendizagem que exclui o brincar justamente porque, entre outras coisas, está comprometida com os nexos sociais a que a escola deve corresponder. No máximo permitido, o brincar é aceito desde que cumpra um tarefa que lhe seja extrínseca: ensinar algo. Não que vá discordar de que o ensino possa ser mais lúdico, mas sim de não se permitir que a ludicidade mostre a que veio e que funções cumpre para um mundo mais belo.

Isto é arte? A pergunta perdeu o sentido. A arte não.

Não vou passar por essas explicações, como se fosse preciso, para se iluminar, empurrar num envelope achatado um mundo de fabulações pela porta estreita dos racionalismos.

Mas é necessário definir, sob a pena de passar por irracionalista: trata-se de um reencantamento do concreto.

E quais são as implicações desse plano de lembranças?

1. O brincar não é uma descarga de energia, mas uma cartografia.

2. É um modo de conhecer o mundo e a si mesmo. Mas de tal modo que um e outro são continuamente reiventados.

3. O brincar é um modo de habitar o mundo.

4. No recreio, os educadores especializados deveriam: a) estudar aplicadamente o que as crianças estão ensinando; b) analisar os ritos infantis; c) pesquisar o modo como as crianças adquirem conhecimento e inventam o mundo; d) entender os relacionamentos coletivos e individuais, as formações de grupos, as zonas de vizinhança, as multiplicidades; e) estabelecer conexões com os sistemas auto-organizativos e meta-estáveis. Complete a lista…

Enfim, é no momento do recreio, de uma atividade livre e não dirigida, que podemos entender a sofisticação que é o brincar.

Mas, enfim, qual o sentido de um recreio num programa de educação infantil? Ali, naquele momento inicial, quando me deixei levar pelo brincar da criança em vez de conduzí-lo (como viria a me forçar, mais tarde, em diversos momentos), encontra-se a resposta. Há nisso, entretanto, todas as possibilidades de misturas e gradientes, passando de um brincar mais livre para um mais dirigido e vice-versa. Não há regras, apenas espaços para a experimentação e a criação.

Referências:

(1) Belo Horizonte, Escola Balão Vermelho, 1974.
(2) Maria Helena Latalisa, Idêda Brito e Bete Lobato, pedagogas e criadoras da Escola Balão Vermelho.
(3) DELEUZE, Gilles. O método de dramatização, in A ilha deserta e outros textos. Editora Iluminuras: São Paulo, 2006.
(4) Virgínia Kastrup aborda as concepções cognitivistas e estruturalista da cognição, mostrando a diferença dessa concepção para a de Deleuze e Guattari que, a partir de Bergson, criam um conceito de infância como contemporaneidade e não mais como algo retido num tempo cronológico. Conferir: http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/188/18813306.pdf